E se não houvesse
Natal?
Publicado no jornal A Tribuna em 24 de dezembro de 2022
É Natal e uma boa parte do mundo vive
a mensagem de amor e paz trazida e vivenciada por Aquele cujo nascimento
comemoramos todos os anos, nesta época. Gestos de solidariedade se multiplicam
e o coração das pessoas é tocado por um “não sei o quê” difícil de explicar,
que leva as pessoas a se emocionarem com gestos que, em tempos normais, nem
notariam.
Mas, como
seria se não tivéssemos Natal? E se uma lei cruel da época em que Maria vivia
tivesse sido aplicada? Não nos
esqueçamos de que, segundo historiadores e Livros Sagrados, ela era muito
jovem, uma menina para os padrões atuais. Mas, de acordo com os costumes de
então, já estava noiva de José.
É fácil
imaginar as regras de moralidade da época. Pobre daquele que se atrevesse a dar
um passo fora dessas regras! (Dá para lembrar o que acontece nos dias de hoje,
em alguns países teocráticos?) Vamos nos abstrair das explicações dos Livros
Sagrados. O fato é que Maria, prometida ao jovem José, fica grávida, sem
conhecê-lo no sentido bíblico.
Ele poderia
denunciá-la e, consequentemente, ela seria apedrejada até a morte. (Alguma
semelhança com casos que até hoje acontecem em certas teocracias?) A
honra do noivo estaria salva, mas, o mundo não conheceria um Ser Divino – para
os que acreditam – ou um Ser Especial – para os não crentes. Alguém que
utilizaria o amor, a paz e o perdão para modificar a Terra, pregando o oposto
do ódio e da vingança. Como José reagiria?
De acordo com os Livros Sagrados, um
Anjo visitou José, em sonhos, e lhe explicou a importância da Criança que
estava por nascer e como havia sido divinamente concebida. Por isso, e porque
José tinha uma índole boa e compassiva, ele se casou com Maria e formou a
família na qual Jesus nasceu e cresceu.
E se José tivesse seguido a lei
injusta e covarde? Não teríamos o Natal nem sua magia. No mínimo, o Mundo seria
mais triste e o ser humano, menos “humano”. Mas, em outra escala, não é isso o
que acontece, mesmo nos países ditos cristãos? Mulheres continuam sendo vistas
como “pertencentes” a seus companheiros.
Apesar das poucas que conseguem se
“empoderar” (termo da moda!) em sociedades machistas e preconceituosas, muitas
são tratadas como objetos que podem ser usados e descartados. Daí os feminicídios
e toda a sorte de torturas impostas por quem não tem uma mínima parcela da
nobreza e da compaixão de José. E as “Marias”, de todos os níveis culturais,
são exterminadas, deixando para trás filhos desamparados e desorientados.
Nos
países onde, inacreditavelmente, as leis morais e religiosas dos tempos de
Maria ainda vigoram, as mulheres continuam sendo impedidas de estudar, sair de
casa e trabalhar; obrigadas a usar trajes que as cobrem inteiramente, talvez
uma maneira de torná-las invisíveis e, portanto, inexistentes; presas,
torturadas e mortas por mínimas transgressões a essas regras. E apedrejadas até
a morte.
Mais de dois mil anos depois, o ser
humano ainda não entendeu a mensagem. Será? Mas, e os que se transvestem de
José para impedir atrocidades e salvar não só “Marias”, como todos os que
necessitam? Maria e José dos Livros
Sagrados cumpriram seu papel com coragem. Deixaram seus exemplos e garantiram
que a mensagem de paz e amor da Criança que criaram chegasse aos que se dispusessem
a recebê-la. Apesar de tudo, mantiveram a esperança em seres humanos
melhores. E, ainda bem, salvaram o Natal!