segunda-feira, 15 de março de 2010

Historinha de terror

Uma pequena história de terror, para variar. Foi feita para um concurso, que exigia pouquíssimas linhas e tema de horror. Claro que não ganhei nada! Venceram os jovens e suas imitações de “Sexta-feira, 13”. Mas valeu a experiência de tentar contar uma história resumidíssima.

O Espantalho

A jovem mulher subiu a escada esbaforida e desesperada. Trancou-se no quarto e na ilógica tentativa de esconder-se, enfiou-se na cama, sob as cobertas. O descontrolado batimento do coração e o tremor do corpo revelavam seu pavor. Não conseguia ouvir nada nem enxergar na penumbra do quarto, mas pressentiu como era terrível o que se aproximava. Quando a porta foi arrombada, viu apenas o rosto de pano, os olhos que lhe pareceram humanos e familiares e a lâmina brilhando nas mãos de palha do espantalho, vestindo as roupas velhas do marido. Acordou tremendo no momento em que ia ser golpeada. A custo, percebeu que tinha sido um pesadelo. Procurou conforto e proteção no marido, dormindo a seu lado. Quando lhe pegou a mão, deu um grito. Era áspera, de palha. O espantalho enfiado no pijama de seda do marido! Com o susto, só percebeu muito tarde o marido em pé a seu lado, os mesmos olhos do sonho, a mesma lâmina, que, desta vez, calou para sempre seu coração.

domingo, 14 de março de 2010

Fonte do Itororó

Por duas vezes, nos anos 2000, critiquei, em artigos publicados no jornal A Tribuna, a constante situação de abandono em que se encontra a Fonte do Itororó, ao pé do Monte Serrat. Agora, com a reforma do “Castelinho”, o antigo quartel dos Bombeiros, para ali ser instalada a Câmara dos Vereadores, talvez fosse hora de se lançar um cuidadoso olhar ao Itororó 

                                     

 

 

                             Itororó para turista

                             nenhum pôr defeito

                                               

 

Não, não encontrei água. Muito menos bela morena. A Fonte do Itororó continua seca, tristemente estéril. Se nos versos da canção de roda não se encontra água, mas sim bela morena para com o cantor fazer par, na verdadeira Fonte do Itororó, nem uma coisa nem outra. Ela permanece ali, quase abandonada, na base do Monte Serrat, bem no início do Caminho Monsenhor Moreira.

          Podem muitos não saber, mas é a mesma Fonte do Itororó que inspirou os versos da canção de roda conhecida por várias gerações de brasileiros, aqueles que brincavam em quintais e calçadas, quando a TV e a Internet ainda não eram ditadoras. Versos que sobrevivem na memória e nas ingênuas brincadeiras de roda das crianças que moram longe dos grandes centros, em lugares onde o progresso ainda não conseguiu quebrar a magia.

          São aqueles versos que teimosos memorialistas e folcloristas mantêm registrados em arquivos, gravações, fitas e História, acreditando que é importante cultivar a memória e a identidade de um povo. Pois a origem da canção, a fonte que inspirou os famosos versos, está ali mesmo, no pé do Monte Serrat, voltada para a rua asfaltada e estreita, muito usada por motoristas que querem fugir do trânsito da Av. São Francisco.

          Passam todos por ali e nem olham, indiferentes à fonte, sem se lembrar da canção: “Eu fui no Itororó/ beber água não achei./ Achei bela morena/ que no Itororó deixei...” Mas a morena também não está lá. Se foi há muito, desencantada com a aridez do Itororó, temerosa da violência da Cidade. Só restou a fonte, pintada de azul, com azulejos lembrando a História. Sem nada quebrado, mas com o limo e a sujeira conquistando espaço.

          O pior é ver seco o pequeno cano de onde deveria brotar água. É ver folhas mortas e papéis sujos onde deveria correr a água da fonte. Claro, ninguém deseja um milagre. A ocupação habitacional do Monte Serrat invalidou qualquer projeto de recuperação da qualidade da água da verdadeira Fonte do Itororó.

          Até mesmo a utilização de tecnologia, como o equipamento para desinfecção e eliminação de bactérias de coliformes fecais, parece não ter obtido resultado, ou, pelo menos, ficou esquecido. Na verdade, a Fonte do Itororó não consegue – com raras exceções – sensibilizar suficientemente as Administrações Municipais para a sua potencialidade turística.

          Já alternou momentos de total abandono com períodos em que a sua restauração atraía muitos visitantes. Já viveu a deterioração total e a pachorrenta manutenção que inclui camada de tinta e rápida limpeza dos azulejos. Ninguém se dá conta do sábio conselho da canção: “Aproveite minha gente,/ que esta noite não é nada./ Se não dormir agora/ dormirá de madrugada”.

          E todos dormem. De dia, de noite, de madrugada e no ponto. Ao contrário de outras cidades turísticas, que até inventam atrações para serem visitadas, nós temos a atração, autêntica, antiga, legado de um tempo ingênuo e romântico, capaz de inspirar canções de roda.

          Argumentos contrários à promoção turística da Fonte do Itororó devem ser examinados e discutidos. A segurança do visitante é um deles. Mas se a fonte está ao lado da subida do Monte Serrat, perto do acesso aos bondinhos que levam ao topo do morro, conclui-se que toda a área merece atenção e reforço de policiamento.

          Se o espaço para sua possível repaginação é estreito, pensemos em alternativas. Afinal, há próprios da Prefeitura no local, não valeria a pena utilizar um pouco desse terreno para a instalação de bancos e vegetação que acolhessem hospitaleiramente o visitante?

          A Fonte do Itororó e todo seu entorno, incluindo o acesso ao Monte Serrat – de onde, sempre é bom lembrar, se tem uma das mais belas vistas – e até a histórica construção que abriga o quartel dos Bombeiros, merecem estar incluídos no acertado projeto de revitalização do Centro.

          Já que estamos levando tão a sério a nossa vocação e a nossa opção pelo turismo, estudemos com carinho o Itororó. Se a água original não pode ser bebida, que tal utilizarmos um simples cano com a boa água tratada da Sabesp?   Só assim a placa afixada acima do cano seco, com os dizeres “Fonte do Itororó”, pareceria menos absurda.

          O final da canção diz que alguém, quem sabe o santista, “entrará na roda,/ ficará sozinho”. Mas com trabalho e boa vontade poderemos responder: “Sozinho eu não fico/ nem hei de ficar/ porque eu tenho o turista/ para ser meu par!”  

           

          (Escrita em 2002)     

                     

Visita ao Itororó

Decepção no colorido Itororó

Domingo, dia 2, 13h30. Tempo bom, calor, sol agradável. Horário de praia, mas, para outros gostos, também horário de passear, percorrer belos pontos da Cidade. Para o santista que está recebendo amigos de outras terras, uma bela oportunidade de levá-los aos melhores lugares turísticos. Por que não o Monte Serrat? Lá de cima será possível ter uma bela vista de Santos, identificar principais ruas e avenidas, ver o porto, o mar. Fica então combinado: primeiro, o Monte Serrat, depois almoçar em local agradável, com boa comida, sem exagero nos preços.

O grupo segue de carro, alegre, para o Centro. No meio do caminho, um dos santistas tem a (in)feliz idéia de contar a história da Fonte do Itororó, entrar em minúcias, dizer que segundo muitos historiadores foi a fonte que inspirou a célebre canção infantil “fui no Itororó, beber água não achei...” Imediatamente os turistas aumentam seu grau de animação, querem saber mais, não se cansam de perguntar.

Quando o santista-que-ama-o-Itororó informa que, na volta do Monte Serrat passarão em frente à fonte, os turistas iniciam uma minirrebelião: nada disso, primeiro o Itororó, depois o Monte Serrat. Mas é caminho de volta, argumentam os locais, sem conseguir convencer os rebelados. Diante do impasse e sendo os anfitriões bem-educados, concordam em passar primeiro na fonte.

Infeliz idéia, reconheceriam mais tarde. Já de longe é possível ver que algo estranho está acontecendo. São tantas e tão variadas cores ao redor da fonte que das duas uma: ou há uma intervenção artística no local ou o Itororó mudou-se. Mas a realidade é bem pior que a fantasia. O que está amontoado ao redor da fonte é uma verdadeira mudança: pequenos móveis, madeiras, roupas, objetos pessoais e uma... bicicleta. Para aumentar a estupefação dos visitantes, uma trouxa de roupa repousa placidamente em cima da bica seca.

Ao redor da colorida mudança, três mulheres conversam tranquilamente, aguardando que alguém venha buscá-las e às suas tralhas ou, sabe Deus, que Ele lhes providencie um destino. Entre os visitantes o silêncio é total. Santistas envergonhados e turistas frustrados avaliam se vale a pena subir o Monte Serrat.

À primeira sugestão de deixarem esse passeio para outro dia, em uma próxima visita, imediatamente todas as vozes concordam. Ninguém fala, mas cada um pensa. Santistas temem que o morro esteja tão abandonado quanto a fonte. Turistas não conseguem disfarçar a decepção. E seguem lentamente em direção à Av. Senador Feijó.

Um caminho que só faz aumentar o baixo-astral: calçada suja, muro do quartel dos Bombeiros descascado, o quartel, uma construção tombada e cheia de encantos, entregue à própria sorte. O santista-que-ama-o-Itororó não consegue articular palavra. Os demais disfarçam. Um dos locais lembra que o Centro está sendo revitalizado, que é preciso dar uma volta de bonde, talvez mais tarde...

Decidem almoçar primeiro. Retornam à orla da praia, escolhem o restaurante, comem muito bem. O constrangimento parece ter passado, a decepção, esquecida. Até chegar a conta. É aí que a observação do turista, feita em tom casual e inocente, abala as estruturas da amizade entre aquelas pessoas: “Se os cuidados com o Itororó fossem tão grandes quanto esta conta, com certeza vocês teriam uma atração turística de nível internacional”.

(Escrita em 2004)

Páscoa e chocolate

Aqui, novo texto que escrevi para a coluna Alto Astral, de Durval Capp Filho, publicada no Jornal da Baixada.

Sabor de amor. E de chocolate

Quem não gosta de ovo de Páscoa? Ou de coelhinhos de chocolate? Pouquíssimas pessoas. O chocolate exerce fascínio e não são poucos os estudos que se propõem a analisar os motivos dessa doce paixão. Os resultados variam da sensação de tranquilidade provocada por componentes do chocolate, até o simples prazer causado pelo gostinho irresistível.

Seja como for, chocolate, para muita gente, é indispensável e os “chocólatras” até se organizam em associações. E, como estamos em pleno tempo de chocolate, parece até que há mais alegria no ar, que as pessoas estão mais sorridentes, talvez mais felizes.

É Páscoa. E é chocolate. Mas, só? Não deveria ser. Este é também um tempo de reflexão. Parar para avaliar se a mensagem de amor deixada há mais de dois mil anos por aquele Homem de Nazaré ainda continua viva. Será que as palavras de perdão (“Eles não sabem o que fazem”), de compreensão (“Ninguém te condenou? Também Eu não te condeno”), de paz (“Eu vos dou a minha paz”) continuam nos norteando?

O amor Dele pela humanidade lhe atraiu o mais terrível sofrimento e a morte. Não caberia a nós fazer com que tenha valido a pena? É tempo de chocolate, sim. Mas façamos com que o doce sabor nos remeta também à meditação e, consequentemente, a um modo de vida mais justo. Se começarmos por nós, poderemos, quem sabe, começar a mudar o mundo. Que poderá vir a ser doce, como ovo de Páscoa!

segunda-feira, 8 de março de 2010

Parabéns às mulheres

Dia Internacional da Mulher! Às mulheres que visitam este blog, PARABÉNS! Aos homens, também. Especialmente aos homens que entendem e agem de acordo com o óbvio: somos todos seres humanos, merecedores de respeito e amor. Só esta colocação já seria suficiente, não vivêssemos em um mundo tão injusto.

Neste Dia da Mulher, pensamos em quantas sofrem por imposições religiosas ou sociais arcaicas e condenáveis. Quantas são espancadas em casa, física e emocionalmente, pelas pessoas que mais deveriam amá-las e protegê-las: maridos e filhos. Quantas são obrigadas a aguentar as consequências do preconceito, da cultura machista odiável, da fome e da miséria.

E quantas erguem a cabeça, lutam e podem gritar, libertas: "Sou mulher, sou gente!" Estas, especialmente, merecem parabéns. Na verdade, todas nós - à exceção daquelas que não agem como seres humanos - merecemos parabéns. Cada uma por um motivo muito particular, mas todas por sermos mulheres e dignas.

Aos homens dignos, também, parabéns! Ao lado das mulheres, vocês lutam para construir um mundo melhor. E esse, ao que me parece, é o grande objetivo que o Ser Maior designou para que alcancemos.