Publicada na Tribuna Livre, do jornal "A Tribuna", em 23/03/2022
Que caiam as máscaras
Literalmente, as máscaras caíram. Mas, e no sentido figurado? Algum dia cairão? Esse insuportavelmente longo período do uso de máscaras contra o coronavirus parece estar terminando. Mas ninguém tem certeza de nada. Aqui, os número da doença melhoraram, a ponto de algumas autoridades permitirem a eliminação de máscaras em ambientes abertos e até fechados.
No mundo, entretanto, as notícias são
desencontradas: os surtos na China e na Europa parecem nos dizer que não é bem
assim; a baixíssima imunização em alguns países de economias mais frágeis e densamente
povoados é uma porta escancarada ao surgimento de variantes; médicos,
especialistas, mídia e redes sociais não chegam a um consenso; fake news
infestam a internet. Os mais velhos são apontados como alvo preferencial do
vírus e sentem-se ainda mais fragilizados. Em meio a tantas dúvidas, há os que
alegremente se desfazem das máscaras e aqueles que juram que não vão deixar de
usá-las.
Porém, há
máscaras que não podemos identificar. São as máscaras usadas por políticos que
prometem melhorar a vida das populações, mas, na verdade, visam apenas
conquistar o poder a qualquer custo, ainda que para isso tenham que gastar
todos os recursos destinados àquelas populações que prometeram ajudar.
São as máscaras de autoridades de
todos os níveis, de todos os Poderes, que decretam, assinam e colocam em
prática atos para destruir os valores que juraram defender, visando unicamente
conquistar votos para sua hegemonia política. São as máscaras que enganam
eleitores, humildes ou abastados, sem instrução ou cultos. São as máscaras da
honestidade escondendo a corrupção. São as máscaras que justificam o
injustificável com mentiras grotescas.
E há as máscaras do cotidiano. As dos
bondosos, que escondem maldade; as dos benemerentes e solidários, que encobrem
desprezo; as dos pacíficos, que não deixam ver a violência; as dos inteligentes
que prejudicam, roubam e destroem; as dos moralmente inatacáveis que são só
podridão.
Também há as de falsos amigos; de
médicos que disfarçam sua falta de humanidade; de professores que escamoteiam
seu desinteresse; de estrelas da arte e do show business que são uma fraude; de
aplaudidos profissionais incompetentes; de ídolos com pés de barro e até de
familiares algozes.
Tudo, infelizmente, é inerente ao ser
humano. Mas o que aconteceria se, como as máscaras físicas, as do cotidiano
também caíssem? Em alguns casos, não nos surpreenderíamos. Mas, em muitos outros,
além da surpresa, sentiríamos revolta, descrença, raiva. Desejaríamos a revanche.
Será melhor, então, que só caiam as
máscaras da pandemia? Não, ideal seria
que todas as outras também caíssem. Difícil, mas podemos utilizar nossa
inteligência e observação para conhecer e diminuir o número de mascarados. Se
não formos ingênuos, se denunciarmos com responsabilidade e tomarmos as
atitudes corretas, muitas máscaras cairão. Nossa vida ficará mais respirável,
da mesma forma que o ar sem o uso das máscaras físicas.
Que nós, os governantes e os
especialistas saibamos tomar as atitudes mais corretas, para que caiam as
máscaras da pandemia. Que seja em breve, na totalidade e em definitivo. Porque
as outras, só podemos ajudar a diminuir o número de quem as usa.