sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Roberto Peres


        A cultura que desafia o vazio

 

 
Em “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman, um filme denso que retrata a humanidade em seus piores momentos, a Morte é personagem constante, marionetando a ação. Ninguém escapa dela, nem o Cavaleiro, que, com seu escudeiro, à maneira de Don Quixote, busca o sentido da Vida. Mas, alguns personagens vencem a Morte. A família de saltimbancos, com seu malabarismo simples, escapa em suas carroças, sob um sol resplandecente.

         Após o susto e a tristeza com a notícia da morte de um dos mais brilhantes protagonistas da cultura santista, impossível deixar de lembrar de Bergman e constatar que, apesar de tudo, o legado artístico deixado por Roberto Fernandes Peres aponta, desafiador, para a beleza do que o ser humano produz de melhor: a cultura.

         A vida de Roberto foi totalmente dedicada às mais diversas expressões artísticas, desde as históricas às contemporâneas. Ele tinha o dom de entender e apreciar o melhor da produção artística, sem concessões, mas com o olhar atento ao que merecia ser estimulado. Era o olhar não só do crítico, do produtor cultural, do jornalista. Mas, também, do artista, que ele igualmente era.

         Capaz de construir instigantes espetáculos no palco, não só aplaudia o que era bom, mas sabia orientar os talentos ainda sem caminhos definidos. As artes visuais o fascinavam, assim como o melhor que o cinema, a literatura, a dança e a música produziram em todas as épocas.

         A fina ironia era sua marca registrada, mas sua alegria também se traduzia em gostosas gargalhadas. Preferia a informalidade, mas, não se ausentava se o compromisso fosse formal. À família, dedicava alma amorosa; aos amigos, gentileza e solidariedade; aos alunos, paciência e estímulo; aos verdadeiros artistas, aplausos e admiração.

         Muitos dos que o conheciam comparavam-no a um computador: guardava tanta informação em sua mente, que parecia impossível que ainda sobrasse espaço para mais conhecimento. Mas ele estava sempre pronto a se atualizar.

         Como todos os que, em nosso País, dedicam a vida à cultura, lutou contra obstáculos. E superou momentos de desânimo produzindo arte. Foi assim como editor de Cultura do extinto jornal Cidade de Santos; como fundador e diretor do Centro de Arte e Decoração de Santos – Cades – que foi um vetor nas artes visuais na Cidade; como crítico e professor de arte; como diretor e produtor cultural; como carnavalesco, levando para a avenida beleza e informação.

         Foram tantas as atividades ligadas à cultura, que se torna impossível enumerá-las. Atualmente, era diretor da Escola de Artes Cênicas da Secult, onde dirigiu vários espetáculos. Essencialmente urbano, gostava também de alguns dias de descanso na montanha. Mas, logo voltava à intensa atividade,  projetando o nome da Cidade e acompanhando de perto o que de melhor estava sendo feito nacional e internacionalmente.

         Sua súbita e precoce partida deixa um enorme vazio na arte. Santos fica mais pobre na área capaz de trazer esperança e dignidade aos ser humano: a cultura. Como Bergman, Roberto Peres acreditava que a redenção da humanidade estava na arte. Mesmo que fosse uma arte de malabaristas. Simples, mas honesta.