Tico-tico inesquecível
Você olha para mim, com uma expressão
desconsolada, e declara: “Não dá, vovó, tico-tico acabou pra mim”! Eu observo
você sentado no tico-tico, as pernas compridas, os joelhos quase encostando no
queixo, e concordo. Você cresceu, João Vitor, o tico-tico fica difícil para
você pedalar. Não posso deixar de sentir uma certa tristeza: embora você goste
muito de sua linda bicicleta, ainda tem vontade de pedalar o tico-tico, único
veículo compatível com a área na casa da vovó, onde você pode “apostar corrida”
com seu irmãozinho Luiz Felipe. E tenho pena. É lindo ver você crescer, mas
isso significa renunciar a outras alegrias, de um tempo em que você era um
garotinho e o tico-tico, uma grande diversão.
Mas não importa: atendo ao seu pedido e faço
as vezes de sinal aberto ou fechado e “dou as partidas” nas “corridas de
Fórmula 1”, vocês de tico-tico ou patinete, eu, de coração feliz por poder
participar desses momentos mágicos. Você chegou aos nove anos pleno de alegria
e disposição, mesmo vivendo esta quarentena, que já está se estendendo muito
além do que imaginávamos no início. A rotina foi alterada, os hábitos tiveram
que se adaptar, a escola e os amigos entraram no modo on-line. As saídas de
casa são raras, o estudo modificou-se, e a diversão, também. E, embora com o
crescimento, você tenha mais momentos de quietude e reflexão, nada tira sua
alegria, sua vontade de correr e de brincar. Afinal, você é uma criança!
Uma criança
amorosa e algumas vezes emburrada ou explosiva, principalmente quando as coisas
não correm como você quer. Mas, logo depois está rindo e encantando quem está à
sua volta. Uma noite, em sua casa, a briga com o Tite havia sido “séria”. Você,
ainda bravo com seu irmão, viu que ele queria tomar água antes de dormir, e não
teve dúvidas: foi na cozinha buscar o copo d´água, que o Luiz Felipe agradeceu
e tomou com prazer. Você é assim, João: não tem espaço para ressentimentos em
seu coraçãozinho.
Muitas
vezes, você surpreende com seus comentários e atitudes que já revelam a
aproximação de uma certa maturidade. Como quando, em sua casa, depois da vovó e
vovô Paulo passarem alguns dias, na hora de despedir, você, como gente grande,
colocou a mão na cintura e perguntou: “Bom, agora, até quando”?.... Ou quando
você chega em nossa casa e logo vai conferindo se o vovô Paulo está por perto.
E cobra: “Cadê o vovô?”
Nesta
quarentena por causa do coronavirus, você, Tite, mamãe e papai estão tendo
oportunidade de exercitar muita paciência e amor. Muitos dias fechados em casa,
você e seu irmão acostumados com as diversas atividades escolares e com a
convivência com os amigos, o jeito é apelar para a web. Aí entram a paciência
da mamãe para ajudar nas conexões e nas lições on-line; do papai, que mesmo em
home office, auxilia quando pode; e a paciência sua e do Luiz Felipe, que
tiveram que se adaptar ao espaço entre as paredes do apartamento. É assim que
vocês exercitam o amor em família, ainda mais unida nestes tempos complicados.
Com os vovós
Ana e Paulo, Janne e Santiago, a comunicação foi inúmeras vezes por vídeo, um
jeito de matar a saudade. O dia em que o Tite me mostrou o livro dos Monsters
Jam, que ele havia colorido, você mostrou o seu, dos prédios mais altos do
mundo. Com capricho, você anotou altura e número de andares de todos eles. Vi
um por um e, mais uma vez, me surpreendi com seus comentários e entonação de
gente grande. Quando eu disse para você guardar bem o álbum, porque ia gostar
de ver daqui a alguns anos, você me “explicou”: “Mas, vovó, aí já vai ter
prédios ainda mais altos”!
E
confirmando que você está se tornando um rapazinho, você me contou dia destes:
“Você sabe que agora eu gosto de pizza”? Curiosa, perguntei: Pizza de quê”? E
você, rápido: “De calabresa, claro. Até experimentei uma de queijo – “muçarela”,
soprou a mamãe – mas não gostei muito”. E como alguém entendido em pizza,
declarou: “Prefiro a de calabresa, é bem melhor”!
Já sabe
lidar com a internet, sempre sob a supervisão da mamãe e do papai, e até tem um
grupo no Messenger, do qual fazem parte você, eu, vovó Janne e memê Rosário. E
se diverte mandando figurinhas para nós ou acrescentando desenhos engraçados em
você mesmo quando a comunicação é ao vivo. Mas, também se diverte brincando de
bartender, usando copos de plástico e enfeites da casa da vovó. Quer todos os
membros da família como “clientes”. Há pouco tempo, vovó precisou ir na cozinha
e não tinha mais ninguém para brincar. E você; “Não vai, não, senão fico sem
fregueses”!
Carinhoso,
alegre – embora atualmente um pouco mais introvertido –, você ainda brinca com
carrinhos e caminhões, junto com o Tite. Não abre mão de acompanhar a Fórmula
1, e seus programas de TV prediletos tanto podem ser um desenho quanto a
filmagem de uma corrida de anos passados. Gosta de desenhar – e desenha bem –
mas é imbatível na construção de maquetes de prédios, ruas e cidades,
utilizando materiais comuns, como pedrinhas e papelão pintado.
Aí está um
pouco de você, João Vitor, aos 9 anos. Nosso bebê de nove anos atrás continua
cada vez mais amado pela família e pelos amigos. Nas “janelas” deixadas pelos
dentinhos que caíram já se debruçam os novos e definitivos dentes, anúncio da
chegada de uma nova fase em sua vida. Que – tenho certeza – continuará cheia de
luz e confiante nas conquistas que estão por vir. Porque você já descobriu que
persistir é preciso. E, se depender do pensamento positivo desta vovó Ana, a
Proteção Divina nunca vai abandoná-lo.