quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Gilberto Mendes


Aqui, artigo publicado na seção “Tribuna Livre”, do jornal “A Tribuna” de Santos. Escrevi-o com o coração, mas, também, com a plena consciência de que Gilberto é merecedor de todas as homenagens.                              

                                          Música Nova e Gilberto

 Lembro-me perfeitamente da figura alta e esguia entrando na Redação. Um sorriso, um cumprimento, um jeito afável, e lá estava ele, diante da minha mesa, pronto para uma rápida conversa. Trazia algumas laudas datilografadas, às vezes junto com partituras reunidas em uma pasta. E eram uma delícia a visita e a conversa com Gilberto Mendes. Já então compositor internacionalmente reconhecido e premiado, não revelava qualquer traço de orgulho. Se houvesse uma cadeira vazia por perto, sentava-se e falava sobre o artigo ou crítica que estava trazendo para ser publicado. Em poucas palavras, resumia seu pensamento e, algumas vezes, conseguíamos fugir do assunto música para trocarmos impressões sobre a vida.

Sempre tranquilo e controlado, quando, a convite oficial ou de entidade particular, ia ao exterior assistir à apresentação de suas composições, não conseguia disfarçar a expectativa, a tensão algumas vezes confessada. E era uma festa o retorno, quando trazia ainda vivos nos olhos e no coração os aplausos, as homenagens recebidas, as amizades iniciadas, o acolhimento de público e autoridades. Tudo recebido com muita simplicidade, com alegria por bem estar representando o País. Com colorido próprio, contava detalhes da personalidade e do modo de vida dos vários povos visitados. Falava entusiasmado dos intérpretes de suas composições e – desconfio – embora descrente, sonhava em ver Santos ocupando um lugar definitivo no roteiro internacional da música erudita contemporânea.

Mas, o santista Gilberto Mendes, que até hoje mora na Cidade, conhecia a batalha constante e estafante para manter viva a cultura. A cada Festival Música Nova, a peregrinação se repetia, por gabinetes de autoridades – que, às vezes, nem sabiam do que se tratava –, por escritórios de patrocinadores. O que lá fora era natural e automático, com verbas destinadas com antecedência aos eventos de música contemporânea, aqui, só depois de muito esforço, de artigos na imprensa, de vários pedidos.

Os anos correram, o Música Nova passou a ser atração – simultânea – também na Capital, até desistir de Santos, no ano passado. Sempre com os pés no chão, até hoje Gilberto reconhece que a música contemporânea não agrada a todos. Muitas vezes é apresentada para público restrito, o que não invalida sua importância, sua pesquisa, sua descoberta de novos caminhos para a composição erudita. No próximo 13 de outubro, este compositor, intelectual e batalhador incansável completa 90 anos. E é também neste ano que o Música Nova comemora 50 anos.

Como “presente”, apenas a certeza da continuidade do Festival, mas não em Santos ou em São Paulo, e, sim, em Ribeirão Preto: foi assumido pelo Departamento de Música da USP naquela cidade do Interior Paulista, o que deixou Gilberto feliz. No programa, cursos e concertos, mais ou menos nos moldes do Festival de Campos de Jordão, como queria o compositor santista. Enquanto isso, no Brasil e no exterior, várias homenagens são prestadas a Gilberto Mendes, reconhecendo sua importância e sua contribuição para a cultura brasileira, com repercussão internacional.

Uma pena Santos, a Cidade tão querida do compositor, não lhe prestar, também, uma homenagem à altura! Poderes públicos, universidades, empresas, agitadores culturais deixaram passar a oportunidade de juntar forças e manter o Música Nova santista, sob a direção de Gilberto Mendes. Mas, apesar de sua Cidade não o fazer, outras terras cuidam com carinho da obra à qual dedicou preciosos anos. Gilberto merece essa alegria.