Lantejoulas em vez de sangue
Confetes, serpentinas e lantejoulas
pelo chão, máscaras coloridas ainda presas a colunas, tetos, portas e janelas.
No ar, um rastro de lança-perfume. Há alguns anos, esse era o cenário de muitos
clubes e associações logo após o término do Carnaval. Os animados bailes com
fantasias, marchinhas e músicas críticas aos costumes e acontecimentos da época
empolgavam. A atmosfera era alegre, calorenta (sem ar condicionado), regada principalmente
a refrigerante e cerveja.
Namoros e até casamentos se desfaziam,
enquanto outros começavam. Alguns cantavam a plenos pulmões, dançando quando
havia espaço. Outros simplesmente levantavam braços e mexiam pernas,
“encaixotados” na multidão de foliões quando a área ficava pequena para tanta
gente. Excessos? Havia, claro! Então, o
lança-perfume foi banido, para que não fosse utilizado para fins ilícitos. Mas,
os departamentos médicos dos clubes transbordavam, com gente sofrendo os
efeitos do álcool em doses exageradas.
Tudo ficou na lembrança. Não mais se
realizam bailes de Carnaval. A não ser matinês infantis, onde os pequenos ainda
se divertem ao som de velhas músicas. Desfiles de blocos, com fantasias
cuidadosamente elaboradas e animados por essas mesmas velhas músicas, também já
não mais existem. Os excessos, nesse caso, nem se comparavam ao que acontece
hoje, com a saída das bandas às ruas e seu rastro de roubo e vandalismo.
E já nem falo dos corsos, com carros
decorados com motivos carnavalescos e batalhas de confetes, serpentinas e
lança-perfumes. Saudosismo? Com certeza! Apenas o lado positivo está sendo
lembrado? E os incidentes e acidentes, contravenções e até crimes da época?
Mas, eram os excessos. E as exceções!
E excessos e exceções foram
aumentando em número e violência. A diversão ingênua e a alegria do Carnaval,
desaparecendo. Então, muita gente optou por curtir a Folia no asfalto. Das
estradas. E todos os anos, nesta época, corsos intermináveis entopem as
estradas, sem confete, sem serpentina, com infinita paciência para não sucumbir
nos congestionamentos. E para suportar inconsequentes motoristas correndo pelos
acostamentos; ou ultrapassando pela direita acima da velocidade permitida e
“fechando” perigosamente o carro ultrapassado porque bobos são os que estão
dentro da lei.
E as câmeras de vigilância? Ora, as
câmeras! Nunca multam esses assassinos em potencial. Quanto aos bêbados atrás dos volantes, nem as
campanhas conseguem conscientizar, nem a fiscalização, apanhar e punir todos,
que são muitos. E há as armadilhas muitas vezes fatais dos assaltos e tantos
outros perigos espreitando quem se aventura pelas estradas.
Não há o que fazer, pensamos. Ou é
assim ou ninguém mais sai de casa. Mas, poderíamos melhorar esse cenário. Refletir
na inconsequência de nossos atos. Sermos mais cuidadosos com nossas crianças, tantas
vezes transportadas sem os cuidados exigidos por lei. A mesma paciência que nos
é pedida nos intermináveis congestionamentos deveria ser utilizada quando a
estrada está livre. Paciência com os outros significa também cuidados com os
nossos.
Vamos exigir mais fiscalização e
repressão à violência. Sim, é Carnaval, mas não há espaço para folias nas
estradas. Excessos, nesse caso, podem ser fatais. Se ser saudosista é preferir
confetes e serpentinas ao sangue nas estradas, então, sou mesmo saudosista.