Publicado na seção "Tribuna Livre", do jornal "A Tribuna", em 7 de agosto
Pais
na paz e na guerra
Após duas tentativas mal sucedidas,
meu pai finalmente ouviu o choro de um filho que acabava de chegar ao mundo.
Era eu, recém-nascida, chorando pelo susto de deixar o ventre materno e,
provavelmente, por causa do frio que – anos mais tarde me contaram – fazia
naquele dia. Nasci em casa, sob a expectativa da família. Todos felizes com a
minha vinda, mas meu pai, emocionado, só queria me segurar em seu colo.
Tranquilizado
quanto ao estado físico de minha mãe, pôde me aconchegar a ele com alegria,
enquanto, como todo pai de primeira viagem, conversava comigo como se eu já
pudesse entender. De repente, passou a me mostrar a sala onde estávamos,
dizendo: “Olha, esta é a sua casa”! E mais não mostrou porque logo me levaram
de volta para o calor da minha mãe.
Ouvi várias
vezes essa história que, até hoje, mexe comigo. Lembro-me do meu pai
trabalhando, de sua luta para manter a família e vencer na vida; de sua
tranquilidade, sua bondade, suas alegrias, suas vitórias e insucessos. E julgo
entender por que o homem, quando se torna pai, passa a sentir o peso de uma
maior responsabilidade.
Penso que, além
da alimentação e da saúde dos filhos, a moradia é, sem dúvida, uma das grandes
preocupações. Há os pais realizados e felizes por conseguirem proporcionar um
teto às famílias, há os amargurados por seus tetos serem precários, há os que
não têm outra alternativa a não ser as ruas. E há, sim, os mais fracos, que
desistem e delegam a função às mulheres.
Então, vejo
na TV as cenas terríveis da guerra, matando, mutilando, destruindo prédios e
casas. Vejo mães e avós fugindo com seus filhos e netos, sozinhas, porque os
homens têm que ficar para defender sua pátria. E imagino o que se passa na
cabeça desses homens, vendo suas famílias irem embora, suas casas destruídas,
transformando-se em soldados em vez de provedores da família.
Mas penso
também nos senhores da guerra, cujos filhos e famílias permanecem sob bons
tetos, protegidos de qualquer agressão. Nada os comove, nem mesmo a imagem do
pai na rua, debruçado sobre o corpo e segurando a mão do filho de 13 anos,
morto por um ataque inimigo. Nem mesmo as crianças separadas das famílias,
sendo conduzidas, aos prantos, para paragens um pouco mais seguras. Nem o pai,
irracionalmente se culpando por não ter conseguido proteger a netinha de 4 anos
e a filha de 24, das bombas covardes que as mataram. Nem todo o horror
escancarado pela mídia.
Esses
senhores não pensam nos próprios filhos porque sabem que estão bem, na rotina
de suas vidas. Mas a ânsia de poder comanda as ações desses homens, mesmo com
custo tão alto. Nada os para, nem mesmo reuniões com dirigentes de nações
poderosas, nem retaliações econômicas, nem apelos de todo o mundo. Merecem o
título de pais? Com certeza, não!
E volto a
pensar nos pais de minha Terra, aqueles que fazem jus à palavra “pai”. Esses
são os lutadores, que tudo enfrentam para criar com amor, encaminhar, defender
e proporcionar um lar, a moradia para seus filhos. Aplaudo os que conseguem ser
pais mesmo na adversidade. Os outros,
melhor esquecer. Podem ser colocados, junto com os senhores da guerra, no rol
do que há de pior na humanidade.